Caminhar pelas ladeiras do Centro Histórico de Salvador, desde o Pelourinho ao Comércio, e no centro antigo em geral, entre casarões e monumentos de séculos, é percorrer a memória da primeira capital do Brasil. Mas essa identidade, com riqueza arquitetônica e cultural reconhecida mundialmente, enfrenta riscos reais: fachadas que desmoronam, casarões centenários abandonados e uma dilema crescente: como equilibrar modernidade e preservação do patrimônio histórico tão cobiçado pela iniciativa privada, sem provocar gentrificação e perda da função social?
Nesse contexto, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) abriu, ontem, consulta pública para a “Norma de Preservação do Conjunto Arquitetônico, Paisagístico e Urbanístico do Centro Histórico de Salvador” e do “Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico da Cidade Baixa de Salvador”. A iniciativa permite que cidadãos, especialistas, comerciantes e entidades contribuam para a definição de diretrizes que orientem intervenções (fachadas, vistas e áreas verdes), e promovam usos compatíveis com a função social do patrimônio. O prazo para participação vai até 10 de novembro de 2025.
Um dos mais importantes exemplares do urbanismo ultramarino português, os conjuntos arquitetônicos são marcos da história, mas do urbanismo colonial português, estruturado entre a Cidade Alta, com palácios, casarões e edifícios administrativos, e a Cidade Baixa, voltada ao porto e ao comércio.
De acordo com o Ipac, essa organização reflete séculos de história e a diversidade cultural da cidade. Reconhecido pelo IPHAN em 1984 e inscrito na Lista do Patrimônio Mundial da UNESCO em 1985, o conjunto testemunha o passado e mantem vivo o presente com sua relevância social , cultural e simbólica para Salvador e para o Brasil.
Minuta – A minuta de portaria e seus anexos, incluindo mapas, foram elaborados pelo IPHAN em parceria com a Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia.
De acordo com o governo federal, a consulta pública quer conciliar a proteção dos bens tombados com demandas contemporâneas, como mobilidade e acessibilidade, adaptação às mudanças climáticas, diversificação funcional e ampliação das áreas verdes.
Acesso – Para participar da consulta pública, é necessário acessar o formulário digital disponível na Plataforma Participa+Brasil. Após o término do prazo, o IPHAN fará a análise e consolidação das contribuições recebidas e publicará as respostas, juntamente com o texto final da minuta de portaria. Dúvidas sobre a consulta pública podem ser enviadas para o e-mail: consultapublica.norm@iphan.gov.br.
Com criterios urbanísticos e divisão por setores, minuta quer opinião publica
De acordo com especialistas, a urgência é reforçada por episódios recentes de desabamento de casarões históricos. Em julho de 2025, parte do prédio da antiga loja A Lâmpada, no Comércio, desabou após um incêndio que consumiu parte da estrutura de madeira. No mesmo local, um casarão pegou fogo. No bairro Santo Antônio Além do Carmo, um casarão na Rua dos Perdões desabou em junho de 2025, meses depois de um incêndio. Casos ccorriqueiros no dia da dia do soteropoitano.
Embora não fossem imóveis tombados, ambos possuíam valor cultural significativo. Esses casos evidenciam os desafios do IPHAN, que enfrenta limitações para fiscalizar e proteger todos os imóveis históricos, especialmente diante do abandono de proprietários e da especulação imobiliária crescente.
Setores -A minuta detalha critérios urbanísticos e arquitetônicos organizados por setores: no Centro Histórico, há setores que abrangem o Pelourinho e o Terreiro de Jesus, concentrando o patrimônio monumental; as ladeiras do Carmo, Santo Antônio Além do Carmo e adjacências, com áreas residenciais históricas; e subúrbios históricos da Cidade Alta, incluindo conventos, praças e edifícios de relevância simbólica. Na Cidade Baixa, a minuta aponta setores como a Rua da Praia e seu entorno, eixo de integração urbana e atividades comerciais e culturais, além dos primeiros aterros e bairros adjacentes, preservando a malha urbana histórica e vistas panorâmicas. Existem outros setores detalhados no documento, cada um com regras específicas de preservação, recuperação e uso compatível, garantindo que o patrimônio continue a desempenhar sua função social e simbólica.
O Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) enviou nota à reportagem reforçando seu papel na proteção do patrimônio estadual e na colaboração com o IPHAN, destacando a necessidade de participação social para assegurar que intervenções respeitem a história e a identidade cultural da cidade. Até o fechamento desta edição, o IPHAN não havia se manifestado sobre a consulta pública







